Publicado por: Amauri Nolasco Sanches Junior e Marley Cristina Felix Rodrigues | 8 de janeiro de 2016

Ser crítico num país não critico

Na minha vida aprendi a não acreditar em qualquer ladainha que me contam ou a ter minha própria opinião, como manda o figurino democrático. Mas me parece que nosso povo além de não saber da política, não ter uma leitura boa – porque as péssimas escolas não ensinam a lerem de forma correta – ainda acreditam e apoiam ideias e modo errado de enxergar as coisas e isso é complicado. Nosso país vive na ignorância completa quando o pessoal acha que democracia é xingar o outro, que as pessoas, as vezes, escreve de forma irônica e não seria, que liberdade é libertinagem e por ai vai. Para começar, a liberdade sexual dos anos sessenta que era um outro contexto, uma outra coisa, virou libertinagem no carnaval como se o Brasil, um país super rico de beleza e de riqueza mesmo, só fosse um país para isso. Se a Suíça é o “paraíso fiscal” o Brasil acabou virando o “paraíso do sexo”, o “paraíso dos pelados” e nada mais do que isso. Podemos até dizer que acontece muito isso, mas em cidades do interior e com adolescentes e então podemos concluir que nosso povo são eternos adolescentes.

Primeiro, temos que explicar o que é crítica, pois  não temos escolas adequadas que nos ensine o que é crítica. Minhas críticas não são críticas do senso comum (ou julgar sem nenhum critério), mas uma crítica filosófica que analisa a questão muito profundamente. Se eu crítico a praia acessível, não é um julgamento apenas, mas uma análise daquilo que é prioritário para a inclusão das pessoas deficientes, não estou apenas julgando. Quando digo que os esportes paraolímpicos não deveriam ser levados como prioridade, não estou indo contra as paraolimpíadas ou o esporte, estou analisando as questões num modo profundo como prioridade. Outro exemplo é que, se não temos nem transporte urbano adequado, porque eu irei lutar por um aeroporto adequado para viajar, pois a luta tem que ter prioridades e não colocar os carros na frente dos bois. Na verdade ser crítico nesse país, você sofre o risco eminente de ser “escrachado” como o chato da turma, ou ser o cara que não gosta de nada e crítica por criticar, pois como diria os jovens de hoje, isso é recalque. Não acho que seja recalque – para quem não leu psicanalise, recalque é algo que você vê no outro o que te espelha, então, quando você xinga uma pessoa você se espelha nela – mesmo o porquê, tenho muitos atletas paraolímpicos no meu Facebook, não gosto de viajar de avião (tenho um medo ferrado de altura), não tenho talento esportivo, mas tenho uma visão bem mais ampla como a maioria não tem.

Ótimo que algumas pessoas tenham aparelhos e condições para fazer um esporte (principalmente cadeiras de rodas boa, pois a maioria é cara e não tem boa qualidade), que tenham condições de viajar de avião ou ir numa praia – nesse calor é muito quente – mas não é a realidade do país onde vivemos que a maioria não tem uma reabilitação de qualidade, não tem tratamento médico de qualidade como qualquer pessoa, não tem escola adequada para estudar e receber uma boa educação, não tem condições de sair de casa por causa das calçadas inadequadas e que não é só prejudicial para o deficiente, mas para qualquer cidadão que pode ter mobilidade reduzida. O que vejo é que criaram um “mundinho” (que me acusam de ficar trancado nele) que só porque meia dúzia de gato pingado conseguiu fazer alguma coisa, todos fizeram como se fossemos um país de primeiro mundo, não somos um país de primeiro mundo, por causa exatamente desse mundinho de faz-de-conta do nosso povo. Já disse e repito, feliz é aquele que acha que a corrupção está nas mãos de um partido só, que o descaso de um país tão lindo e rico, está numa só pessoa. Não é só o PT (partido dos trabalhadores) que corrompe e espalha o descaso a inclusão, o PSDB (partido social democrático brasileiro), vem fazendo um “maquiamento” da inclusão, pois as ETECs não são preparadas para as pessoas com deficiência, a página da Secretaria dos (Direitos?) do Estado das Pessoas com Deficiência bloqueia quem faz críticas a ela, não houve esclarecimento o porquê da venda de milhares de cadeiras adaptadas de praia a um ferro velho,  não houve nem resposta da secretaria numa carta que o movimento Irmandade da Pessoa com Deficiência mandou a ela em 2010. Com tudo isso as pessoas estão preocupadas com as Paraolimpíadas e me acusam de estar num “mundinho”, que só luto no Facebook e não vejo o mundo real, reles engano. O meu mundo é a realidade de um país que existem pessoas que não tem nem o que comer, que andam de carrinho de pedreiro porque não podem comprar uma cadeira de rodas, que perdem a visão ou perdem a pouca mobilidade que tem para se locomover, porque a entidade que elas se trataram houve descaso.

Me acusam de “chato pra car*”, mas o “chato” aqui levou meia hora para remarcar uma consulta medica daqui três meses porque a prefeitura tirou o direito de visita residencial. Quantos idosos e pessoas com deficiência vão ser prejudicado por causa do descaso do prefeito de São Paulo? E é São Paulo, uma cidade grande com milhares de habitantes que as vezes, tem alguma informação e algum outro recurso, mas existem cidades no interior ou cidades do nordeste e norte do nosso país, que não tem nada e as pessoas são tão ignorantes, que até acorrentam as pessoas deficientes com vergonha das suas deficiências. Sempre aprendi na luta e na FCD (Fraternidade Cristã de Deficientes), onde tenho um carinho especial, que se uma pessoa dá o passo mais lento do que as outras, nós vamos lá e andamos mais devagar. De repente estamos andando muito depressa e nesses passos apressados estamos esquecendo daqueles que não podem andar aos nossos passos, ou até mesmos, alguns sobem em cima daqueles que não podem andar nos mesmos passos para vencer e ganhar dinheiro. Liberdade tem seus limites e o ganhar dinheiro deveria ser consequência do trabalho que se faz e que se fez, não uma regra de achar que se tem que ganhar dinheiro, e sim, fazer um ótimo trabalho. É muito “bonitinho” ter consultorias com nomes pomposos como “Talento Incluir” ou “Isocial” e não ter a capacidade de olhar um todo sem ferir o objetivo, por exemplo, muitos RHs (recursos humanos), cometem o erro de olhar as pessoas com deficiência como todas as pessoas e que tem que ser como as outras pessoas e que, queiramos ou não, temos nossos limites e se não temos nenhuma chance, então, não teremos nenhuma experiência. Ao meu ver essas consultorias são fachadas para esconder a única realidade que existe, não há ignorância, porque há muita informação na internet e o empresário que não quer se informar está fora da realidade do mundo, não há cumprimento da lei de cotas que deveria ser mais severa e ponto, o resto é conversa para boi dormir. Se cria um “mundinho de faz de conta” e me acusam que esse “mundinho” é meu e não deles, onde as pessoas estão preocupadas em ir para a Paraolimpíada, enquanto existem pessoas que não tem um prato de comida na mesa, que não podem nem comer um chocolate, porque tem que ajudar nas despesas de casa.

É muito fácil chegar onde chegou com ajuda – me desculpe, mas com toda a certeza alguém ajudou arranjar emprego e não me venham de talento que sou cético a esse tipo de empregador “bonzinho” – mas a realidade é muito mais feia do que o mundo encantado onde se construiu um alicerce para as pessoas inventarem mais mentiras, afinal como dizia aquele ministro nazista, uma mentira contada mil vezes se torna verdade. Qual é a verdade das pessoas com deficiência? Qual a realidade de pessoas que não tem o direito de nem mostrar seu talento? Cadê a mídia especializada como a Incluir, a Sentidos ou a Reação que não mostra a realidade e nem tem colunistas com deficiência e se tem, são voluntários? Pagar um salário para o empregado com deficiência na tabela que está sua profissão, porque estar qualificado é outra coisa, é muito difícil porque as pessoas acham que a deficiência é um limite ao talento. Não se valorizam pessoas porque aumentaram a multa das vagas de idosos e deficientes, nem quem divulga essa informação, mas se valoriza aquelas pessoas que olham para as pessoas de igual para igual e entendem o que ela sofre. Enquanto temos talentos ótimos que a anos escrevem textos excelentes, se divulga blogs que não tem nada a ver com a temática da inclusão dentro de uma revista sobre a inclusão. Como faz então? Qual é esse critério de escolher pessoas que escrevem textos que não tem muito a ver com a temática? Porque tem a ver com o “mundinho encantado” que se criou dentro da área de inclusão, porque começaram a olhar dentro da rede social ao invés de olhar para o mundo real. Eu, realmente, duvido que fotos de sorrisos mostram pessoas felizes e contentes e sim, mostram pessoas que querem vender um personagem de um mundo que nunca vai existir.

A existência desse mundo é muito importante para os “paladinos da inclusão”, porque eles têm um talento incrível de distorcer a realidade ao seu favor, pois não existe talento sem estudo. Não existe emprego sem se esforçar e mostrar aquilo que é capaz, a escrita é para poucos e esses poucos não são valorizados por falar sem fazer “média”. O Ser um Deficiente não faz média e nunca esteve nessas revistas, porque mostra a realidade do cadeirante com o calo na mão, com o diploma e não é contratado, mostra o descaso dentro da saúde, dentro da educação e dentro do emprego. Mostra que sem transporte e uma boa cadeira de rodas ou outro aparelho, nunca vamos a consulta medica, nunca vamos aos estudos, ao trabalho e que sem isso, não vamos nem nos aeroportos. Eu sou crítico e todo crítico não acredita em crenças, não acredita em fé cega de uma inclusão de fachada, não acredita que todos podem ter o que poucos tem. Ótimo que alguns venceram, mas outros ainda exigem o direito de sorri, de se expressar e de viver, que é o maior bem que Deus permitiu que tivéssemos e o homem, demasiado humano, nos restringe. Como diz o Cazuza, o tempo não para e não vou parar, podem ter certeza disso.

Amauri Nolasco Sanches Junior, 39, escritor, publicitário, técnico de informático e escreveu o livro Liberdade e Deficiência e O Caminho.


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